O Quadrante de Lula
Esse é o título parafraseado do livro “O Quadrante de Pasteur”, do falecido Prof. Donald Stokes, decano da Universidade de Princeton e especialista renomado em Ciência e Tecnologia. Ele descreve com maestria por um lado, a relação fundamental entre o desenvolvimento econômico social de uma nação e a implementação de uma política científico-tecnológica, sob o controle do estado, como forma de garantir o que nós, hoje, conhecemos por sustentabilidade. Para tanto, mergulha nos detalhes da formação da competência de ponta em paises europeus e, principalmente, nos Estados Unidos da América.
Por outro lado, mostra também que o modelo linear da compreensão entre ciência básica e ciência aplicada, num plano dimensional, abriga armadilhas que as agências governamentais se digladiam, sem chegar aos resultados esperados no longo prazo. Essa aventura é uma festa para o oportunismo e fisiologismo político na liberação de verbas às múltiplas esferas cientificas determinantes do desenvolvimento sustentável. Algo como vem acontecendo no caso reativo da febre aftosa, ou como ocorreu com o inepto, por não mandar chuvas, São Pedro, no apagão de 2001, ou na “utilização do volume morto” em 2014 por São Paulo. Faltam investimentos em infra estrutura e utilização de energia limpa.
O que uma sociedade carente de tudo como a brasileira necessita, é principalmente de resultados positivos e expressivos. Mas no caso da Ciência, as considerações de uso da ciência aplicada (senão imediatos, pelo menos a médio prazo, crêem os utilitaristas) na alocação das verbas escassas, divergem da necessária busca do entendimento fundamental da ciência básica , que é, a longo prazo, o esteio e fonte da primeira.
Em um esforço diagramático, visualize um plano cartesiano com dois eixos e origem em zero: o vertical, com duas escalas de 50 e 100, é a Busca de Entendimento Fundamental (A), o horizontal, também com duas escalas de 50 e 100, é Considerações de Uso (B). Agora, os quadrantes: 100 de A com 50 de B = pesquisa básica pura, denominada pelo Prof. Stokes de quadrante de Bohr, em homenagem ao cientista Niels Bohr, visto que a sua procura por um modelo atômico foi claramente “uma viagem de descoberta”, que hoje em dia refaz os principais conceitos da Física moderna. Já as coordenadas 50 de A com 100 de B = pesquisa aplicada pura, denominado de quadrante de Edison, dada a maneira estrita com que Thomas Edison, inventor do final do século XIX e XX, ia descobrindo implicações cientificas em um sistema de iluminação elétrica comercialmente rentável. O terceiro quadrante é o mais expressivo, e titulo do livro: quadrante de Pasteur, 100 de A com 100 de B, visto o claro exemplo de Louis Pasteur, que aos 22 anos de idade mergulhou no enigma do ácido racêmico, na busca do entendimento dos agentes microscópicos que o levaram ao entendimento das doenças (vacina anti-rábica) e de processos industriais como a fermentação e pasteurização. Já o quarto quadrante, 50 de A com 50 de B, não está vazio, e neste inclui a pesquisa que não é inspirada pelo objetivo de entendimento nem pelo de uso. São pesquisas impulsionadas pela curiosidade do investigador sobre fatos particulares, como por exemplo, o porque o Brasil piorou no ranking da corrupção, durante o atual governo. Com raras exceções, são pesquisas que saem do nada e chegam a lugar nenhum.
Considerando-se as trajetórias dinâmicas que conectam a pesquisa nos quatro quadrantes expostos acima, o desafio é soerguer o país no futuro, uma vez que estamos atolados neste último quadrante, sem perspectivas de apoio ou de planos sérios do estado. Hoje o Livro Verde, resultado de um trabalho de mais de 400 cientistas brasileiros sobre a Ciência, Tecnologia e Inovação do nosso pais, já amarelou e está apodrecendo em algum canto de gaveta dos ministros que freqüentam a ciranda política. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) vem pedindo formalmente ao governo federal pelo fim da retenção de verbas, mas não há sinais de liberação no curto prazo, principalmente as vinculadas do fundo setorial recolhido das empresas, mas ainda não liberadas para financiamento de pesquisas. São cerca de 2,8 bilhões de reais esquecidos no quadrante de Lula, não recuperados pelo Ministro Clélio Campolina, e que a atual presidanta não liberou.
Márcio Bambirra Santos
mb@mbambirra.com.br
Professor