A César o que é de César
O artigo pretende apresentar as diferentes formas de se avaliar o desempenho de uma nação nos tempos atuais, mostrando que análises superficiais de indicadores só levam a conclusões de maior risco, quanto ao investimento em seus papéis no mercado mundial. Associados então, ao Índice de Percepções da Corrupção, a evolução das macro-avaliações comporta critérios, que não apenas os econômico-financeiros, para posicionar uma empresa ou país em sua máxima performance comparativa nos tempos atuais.
I – Introdução ao Admirável Mundo Novo. Novo?
O proselitismo inerente à gestão organizacional nos tempos atuais aponta numa direção: o acirramento da competitividade. Mais dia menos dia, o empresário constata que o monopólio econômico _mais conhecido atualmente como concentração, fusão e/ou incorporação_ é apenas um sonho de peixe pequeno, mas ação comum dos tubarões que identificam as melhores taxas de lucro do mercado e possuem capital acumulado para exercerem o seu apetite voraz.
A lógica do sistema, no entanto, é dialética, pois o que seria dos grandes se não fossem os pequenos? Enquanto os primeiros permitirem, a idéia básica do pequeno e médio empresário é não sucumbir, não perder o negócio; quase que intuitivamente, sobreviver. A partir de um certo equilíbrio operacional, a normalidade aponta para a busca da melhoria das condições para galgar posições, mínimas que sejam, junto à concorrência.
Na sociedade atual de exigências crescentes (exponenciais) dos consumidores, reforçadas pela mídia mundial, bem como pela Internet, as referências passam a ser “classe mundial”, mas não somente para o usuário final de bens e serviços, como também para a cadeia produtiva responsável pela realização dos mesmos. Todos querem uma satisfação plena que agrega não somente o preço, mas também a qualidade intrínseca, o prazo, o atendimento, a segurança, dentre outros fatores de consumo.
Do lado individual, o desejo é presa fácil da propaganda globalizada, e no lado corporativo as empresas iniciam um jogo onde o objetivo é a conquista dos ganhos de produtividade, via aumento da receita ou corte nos custos.
Tudo isso com um sentimento de mérito: quem sabe atua (e ganha), quem não sabe bate palmas (ou fecha)…
A gestão então, é a própria equação que uma vez resolvida, mostrará o caminho menos tortuoso e mais eficiente para o sucesso do empreendimento. Ela é observada de “vizinhos” e parametrizada para comparações entre modelos, adaptada para realidades especificas e aperfeiçoada como a bandeira representativa da luta no dia-a-dia. Não necessariamente nessa ordem, mas existe um diferencial precioso para a organização que souber melhor aplicá-la. Afinal, não é no mercado que nada se cria, tudo se copia?
II- Mérito e Indicadores: Atenção, Atoleiro !
A aposta é uma só: “diga-me com quem tu andas, que te direi quem és…”.
São os chamados círculos virtuosos, ou seja, a taxa de rendimento do conhecimento novo depende da quantidade de conhecimento existente, e esta depende dos incentivos para investir em conhecimento. “No país rico, os trabalhadores qualificados fazem aumentar a produtividade uns dos outros; no país pobre, tem-se o inverso, os trabalhadores não qualificados diminuem a produtividade uns dos outros” (1). Mas, o eldorado pode ser apenas uma miragem, isto é, a rentabilidade do investimento do individuo depende dos investimentos em conhecimentos realizados por todos naquele momento e local, e não só dos realizados por ele. Dessa forma, mesmo sabendo-se do dito popular “O rio corre pro’ mar”, a capacidade de planejamento associada à necessidade de superação das dificuldades, deve ter uma prioridade de aumentar o estoque total de conhecimento. É uma questão que bifurca na Economia e na Educação, tendo como ponto de convergência, uma escala de valores que, invariavelmente no médio e longo prazos, compensará os maiores e melhores esforços. Portanto, a competência se estabelece ou migra para onde pode ser ampliada.
No entanto, há deformações de mentes (aqueles teóricos de forte presunção academicista e que não são imunes às colorações ideológicas) que acreditam que um processo meritório irá roubar a alma da comunidade, e que tudo não passa de mais uma articulação imperialista de Satã. Para eles, não existem diferenças na capacidade e engenhosidade das pessoas, e todos os gatos são pardos de dia ou de noite. Medidas de avaliação então, socorro!?!
Apesar dos pesares, a aceitação do principio do mérito está vinculada à cultura da organização, ou seja, como os seus colaboradores incorporam e mantêm as suas respectivas identidades pela competência, desempenho e resultados finais, sem serem levados pelo canto da vaidade ou produzindo uma competição excessiva / compulsiva. O equilíbrio de critérios e a imparcialidade na avaliação, além de favorecerem a transparência e democracia, apontam rumo ao nivelamento de oportunidades, e ao surgimento natural de profissionais mais qualificados e talentosos. Se na esfera das organizações privadas, o mérito já conquistou prestigio a ponto de indicar as áreas de melhor desempenho que receberão os maiores investimentos, nas instituições públicas a idéia de valorizar a qualidade ainda não está consolidada.
Uma das formas mais tradicionais na Economia internacional para saber o nível de bem-estar de um povo é medir a sua renda pessoal, e a própria concentração de renda, através da tradicional (elementar em trabalhos estudantis pertinentes) Curva de Lorenz. Ela parte de uma reta eqüidistante a 45º de um plano cartesiano composto de eixos que são os percentuais de rendimentos, e que representa uma igualdade absoluta, ou seja, sem concentração de renda. Quanto maior for o arco à direita da reta, mais concentrada a distribuição de renda. Analisando tais curvas, Corrado Gini, economista italiano, criou o Índice de Gini, que aponta, numa escala entre 0 (zero) e 1 (um), a desigualdade entre a população (quanto mais próximo de 1, a situação é mais dispare).
Atualmente, o Brasil ocupa o 8º lugar mundial na concentração de renda; acima dele, sete paises africanos.
Na realidade, as lógicas de análise das Curvas de Lorenz e Índice de Gini, podem ser aplicadas a qualquer variável que enfatizem uma distribuição do total.
O que se tem verificado é que durante décadas, a mídia veio divulgando que o desenvolvimento de uma nação se vinculava ao crescimento de seu Produto Interno Bruto (PIB) e renda per capita, e de que o desempenho das empresas seria a razão do seu faturamento anual. Felizmente, houve uma evolução desse pensamento, de forma inexorável.
Com a sistemática necessária e disseminada no levantamento de dados, a pesquisa de um padrão mais flexível (adaptação às diferentes realidades mundiais) e comum na análise dos mesmos, e a necessidade da redução no risco de investimentos, outros indicadores começaram a despontar, inclusive alguns mais sofisticados em suas medições como o Índice de Qualidade de Vida, da Revista The Economist, que envolve fatores como o PIB, expectativa de vida, estabilidade política, taxa de divórcio, assiduidade em igrejas e sindicatos, desemprego, liberdades civis, igualdade entre os sexos, clima e geografia.
Mas, o indicador mais em voga nos estudos comparativos globais, é o advindo da Organização das Nações Unidas (ONU), para concessões de empréstimos (via Banco Mundial) e programas assistenciais, ou seja, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) que compreende a taxa de alfabetização do país, a expectativa de vida dos habitantes e o PIB per capita. O Brasil está em 72º lugar, sendo a Noruega, Suécia e Austrália os três primeiros melhores lugares do mundo, pelos dados de 2004.
Não se pára por aí. Há ainda outras formas de avaliar o desempenho econômico de paises, denominadas de rating que são as notas de agências de classificação de risco de crédito (S&P Standard & Poor’s, FitchRatings e Moody’s, são algumas das principais empresas que vendem seus serviços de avaliações para investidores do exterior) atribuem à capacidade de um emissor (um país, um banco ou uma empresa) de honrar o pagamento de uma dívida. Tais notas influenciam decisões de investimentos no mundo inteiro, pois servem como uma espécie de “folha corrida” do país no mercado internacional. Quanto melhor o “rating” de um emissor, menor o seu custo na tomada de empréstimos no exterior.
O risco é medido pelo número de pontos percentuais de juros que determinado governo tem de pagar a mais que os EUA para conseguir empréstimos no exterior. Esse é o
país referência_ juntamente com chamada “zona do euro” _ para metodologia de classificação soberana, que está baseada em experiências conhecidas por default , visando identificar um conjunto de indicadores-chave (quantitativos ou qualitativos) que medem a capacidade e vontade de pagamento, o que permite avaliar e monitorar de maneira consistente, ao longo do tempo, a “qualidade creditícia” dos países em questão. Em outras palavras, um risco em torno de 500 pontos significa que os títulos do país pagam ao investidor, em média, um prêmio extra de 5%, na comparação a um título dos EUA, considerado de risco zero.
A avaliação é extensiva à moral coletiva também. Há, por exemplo, um indicador que mantêm estreita correlação com os quantitativos acima: Índice de Percepções da Corrupção, desenvolvido pela ONG Transparência Internacional (2) em cerca de 160 países, com uma escala que varia de 0 à dez pontos, através de relatórios de agências e entidades internacionais, como o Fórum Econômico e centros de pesquisas universitários de várias partes do globo. Neste, o Brasil possui 3.7 pontos, estando na 62ª posição, atrás da Colômbia, Uruguai e Chile. Os de maior pontuação são Islândia, Finlândia, Nova Zelândia, Dinamarca e Cingapura, todos acima de 9.0 pontos.
De repente, o exposto acima, parece não ter nada a ver com a realidade de um mero cidadão de classe média em qualquer lugar do planeta. Ledo engano, pois se esse mesmo cidadão possuir uma poupança, muitas vezes proveniente de uma vida inteira de trabalho, vai querer aplicá-la com o melhor rendimento de mercado. É o pensamento do clube de velhinhas aposentadas de Palm Springs à corretora de investimentos em Londres, passando por George Soros, América Latina, Ásia, etc. É aí que mora o perigo, onde surge o canto da sereia para os desavisados ou ingênuos do mercado. Aplicam o dinheiro, mas sem considerar riscos ou oscilações. Um bom exemplo envolveu, infelizmente, mais de 500.000 italianos que tinham suas economias atreladas ao “Tango Bonds” e que arcaram com um calote-oficial pela renegociação da divida Argentina. É vero: Francesco aplicou 100, com expectativa de ganhos de 30, perdeu 75. Quem se preocupou em analisar o rating Argentino de anos anteriores, verificou que a partir de 2001, declaração da moratória portenha, a sua média anual girava em torno de 4.200 pontos. Veio atingir 5.400 em setembro de 2004 (3), ou seja, uma “roleta russa” em aplicações financeiras que suscitaram na “troca” de títulos da dívida, moeda podre, proposta pelo atual governo argentino, com validade oficial declarada até o mês de fevereiro de 2005. No ranking da honestidade, Índice de Percepções da Corrupção, a Argentina está em 97º. lugar, com 2.8 pontos.
III – Quem não se comunica….
Para as empresas, além da propaganda em “vender seus peixes”, há uma preparação da informação, que visa à disseminação de seu desempenho _dirigida aos acionistas e investidores_ de indicadores financeiros (faturamento, endividamento, ROI, dentre outros), e que na última década, sofreram sensível ampliação em suas análises, pois incorporaram critérios de modelos de gestão, para um melhor conhecimento da saúde da organização. Um modelo é aquilo que é, principalmente, desejado. Entretanto, seja no “mundo fashion” ou em qualquer realidade de menor glamour, querer é uma coisa, poder é outra. Se este é o que interessa, preparemo-nos para tal, ou vamos continuar só assistindo.
Da cabeça de cada doutorando em Administração de Empresas, nas diversas universidades espalhadas em todos os continentes, pode surgir um modelo infalível de melhor resultado para as empresas. Como foi, por exemplo, os CCQ’s (Círculos de Controle da Qualidade), Governança Corporativa ou a aventura da Reengenharia . Mas, nessa seara, por princípios heurísticos, não há milagres, nem santos curandeiros que resistam, sobretudo, à força do tempo na demonstração dos resultados, pois a empresa é acossada, sem fôlego e o tempo todo, pela concorrência.
Os modelos hoje praticados então, mais resistentes contra essa “ação do tempo”, são os estruturados para obterem uma certificação reconhecida no mercado onde atuam (ISO, CMM, Selos de Qualidade, ITIL, etc) (4), ou para uma melhoria contínua rumo a excelência de seus processos produtivos (Malcolm Baldrige National Quality Award nos E.U.A., Deming Prize no Japão, Mouvement Français pour la Qualité – MFQ na Franca, Prêmio Nacional da Qualidade no Brasil, Prêmios regionais, setoriais, etc) (5).
A linha comum dos fundamentos desses critérios é o mercado competitivo globalizado, por isso se fala em “classe mundial”. Atendeu em Oriximiná no Pará, satisfez também em Bruxelas, Dusseldorf ou Montreal, existindo para tanto, as versões e atualizações conforme se apresenta à dinâmica de mudanças e evolução das empresas.
Liderança e constância de propósitos, inovação, visão sistêmica, responsabilidade social, orientação para resultados, agilidade, são alguns desses fundamentos que, devidamente parametrizados, são avaliados para, na filosofia corporativa, também tentar responder o enigma existencial: “o que sou, onde estou, para onde vou?”.
Nesse contexto se insere o “Programa Mineiro de Qualidade e Produtividade – PMQP” (6), que é um exemplo avançando a passos largos na representação e disseminação dos conceitos e aplicações dos critérios da excelência no estado de Minas Gerais, tanto para as instituições públicas, como para empresas privadas. Decerto, existem outros prêmios regionais e/ou específicos, mas esse possui particularidades que são diferenciais positivos.
Nele, coexiste de um lado o PMQ (Prêmio Mineiro da Qualidade) que, a exemplo do PNQ (Prêmio Nacional da Qualidade), possui critérios que são decompostos em itens, somando um total de 500 pontos, numa avaliação precedida por bancas de profissionais que analisam um Relatório de Gestão da participante e realizam visitas de verificação. As empresas que se candidatam recebem, no final do processo, um Relatório de Avaliação que, no mínimo, torna-se um forte guia para a otimização do desempenho futuro. O relatório abrange todos os critérios preconizados pelo modelo da excelência, e que não são diferentes entre os prêmios existentes, seja o nacional ou os regionais/setoriais, mas criam réguas (avaliações) com crescentes pontuações que vão de 250 a 1000 pontos, variando a quantidade de requisitos considerados nas empresas, o controle dos mesmos e as práticas de aprendizado que levam a maior maturidade organizacional. Tais critérios são: Liderança, Estratégias e Planos, Clientes, Sociedade, Informações e Conhecimento, Pessoas, Processos e, o mais importante, Resultados.
O prêmio por ser regional, é direcionado a um estágio intermediário de bom desempenho, mais afinado com a realidade da prática gerencial na maioria das empresas, o que também incentivou o lançamento do Prêmio Mineiro de Gestão Ambiental para 2006.
Por outro lado, ainda no PMQP, há também o PGQE (Programa de Gestão da Qualidade Rumo a Excelência), como um programa marsupial que se configura como sendo o passaporte de pequenas e médias empresas à solidez de um mercado competitivo. Possui uma metodologia atrelada aos critérios de excelência, mas com avaliação por indicadores de desempenho a curto e médio prazo, possibilitando a empresa participante já constatar resultados do projeto. Quem conduz o processo de transformações, são consultores experimentados e treinados previamente no modelo. Em síntese, “a criatividade surge em virtude de um processo dialético entre indivíduos de talento, campos do conhecimento e práticas, e esferas de juizes instruídos” (7).
IV – Conclusão
No Brasil de hoje, a par ou não do estereótipo do otimismo nacional, tais considerações não são fruto de uma moda passageira ou inerente a uma comunidade privilegiada distantes da empresa tupiniquim, notadamente as pequenas e médias.
As associações classistas patronais, sindicatos de trabalhadores, órgãos de fomento governamental (alguns poucos, sem dúvida), já entendem que a estrada de mão única neste inicio de século é uma competência brasileira consolidada em termos de gestão, onde o aumento da produtividade, qualidade e competitividade de nossos produtos e serviços sejam condizentes a demanda nacional e internacional, no mínimo para a sobrevivência.
Referências
- EASTERLY, W. “O Espetáculo do Crescimento”, RJ, Ediouro, 2004, pág. 209.
- www.transparencia.org.br
- Banco Central do Brasil, Investor Relations Group, Country Risk, December 2004, Frequently Ask Questions Series, pag.13.
- Séries ISO 9.000 ou 14.000, referentes ao Modelo de Gestão da Qualidade e do Meio Ambiente, respectivamente; CMM-Capacity Maturity Model, ITIL-Information Technology Infrastructure Library e COBIT-Control Objectives for Information and Related Tecnology, utilizados pelas empresas de informática; Selos (setoriais) da Qualidade como da AJORSUL; Selo RIO Design; Novo Mercado da Bovespa; dentre outros.
- SANTOS, M.B. “Mudanças Organizacionais: Métodos e Técnicas para a Inovação”, BH, Ed. Inovarte, 2004, pág. 123.
- www.pmqp.org.br
- GARDNER, H. “Os Padrões dos Criadores” in BODEN, M.A., org., “Dimensões da Criatividade”, P.Alegre, Ed. Artes Médicas Sul, 1999, pág. 151.
Márcio Bambirra Santos
mb@mbambirra.com.br
Professor