Cirurgia Plástica
O Brasil sempre foi um país de muitas vaidades e um dos marcos do narcisismo tupiniquim foi o campeonato mundial de futebol de 1958 (Suécia), quando Nélson Rodrigues afirmou que perdíamos, com a tal conquista, o complexo de cachorro vira-latas, adquirido 8 anos antes na final da copa no Maracanã, contra o Uruguai.
Como a memória do povão é duvidosa, nem adiantava ressaltar expressões da idolatria mundial anteriores à data, como Santos Dumont, Villa Lobos, Rui Barbosa ou Carmen Miranda, só para contrapor os latidos desse complexo.
De qualquer maneira, de lá para cá, outras celebridades vêm adensando o nosso ego social como Maria Ester Bueno, irmãos Vilas Boas, Ieda Vargas, Paulo Freire, Niemeyer, Marta Vasconcellos, Tom Jobim, Fittipaldi, Pelé, Augusto Ruschi, César Lattes, Chico Mendes, Senna, Gisele, dentre tantos outros destaques da mídia internacional, além é claro do artesão global de todas as vaidades que é o belzontino Dr. Ivo Pitanguy.
O país, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica ocupa o 2º lugar no mundo, depois dos EUA, na busca da melhoria da beleza corporal, pois ocorre uma média de 500 mil cirurgias por ano, movimentando algo em torno de R$ 2,5 bilhões em produtos e serviços. Haja pelanca, mas atrás dessa, também vem correções de acidentes, estética e auto-estima rumo a uma maior qualidade de vida. Já tem até banco com linha de crédito especial para atender clientes interessados no bisturi restaurador. Afinal, se Afrodite a deusa da beleza descesse do Olimpo, provavelmente teria endereço brasileiro, quem sabe na ilha de um médico cirurgião plástico…
Nessa época de eleições então, é que percebemos o que é a vaidade da alma humana. Vemos candidatos com tudo quanto é artifício para não retratar as suas realidades pessoais e políticas. Começam com a utilização das fotos de três ou quatro campanhas atrás, como se tivessem descoberto a fonte da juventude. Não envelhecem nunca. Dão um trato na dentadura, na peruca ou tinta do cabelo e na maquiagem, pois afinal o sol e o fotoshop nasceram para todos. Depois é a roupa, combinando com a gravata ou o colar, o vermelho do batom ou “blush” anti-reflexivo, inclusive nos homens (reparem), sem falar nos brinquinhos e outros aparatos (chifre de boi, farda da corporação, etc). Sem muita ostentação é claro, para não indicar opulência, ao menos por agora, valendo inclusive frases de efeito enaltecendo a família, a região, um trabalho nunca realizado ou de resultado duvidoso. Esforçam-se tanto, como quisessem substituir o Poeta em “O Fingimento”, de Fernando Pessoa: “O Político é um fingidor. Finge tão completamente, que chega a fingir que é dor, a dor que deveras sente”. Até ensaiam direitinho a leitura no teleprompt na frente das câmeras, disfarçando uma educação ordinária. Reflexo óbvio da última pesquisa da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), revelando que os estudantes brasileiros estão em penúltimo lugar no desempenho em Matemática e Ciências e no 37º. em leitura, de acordo com um teste aplicado em adolescentes com 15 anos de idade de 41 países, corroborando a faceta do analfabetismo funcional.
Outros muitos candidatos, principalmente os envolvidos no manto da corrupção que colocam o país no 63º. lugar no ranking mundial da Percepção de Corrupção, exercitam a amnésia coletiva e a retórica superficial (se colar, colou) quando questionados pela imprensa, ou aparecendo na propaganda televisiva obrigatória. Como se nada tivesse acontecido: “Quem? Eu? Não era comigo!” Ou o famoso “Eu não sabia…”. Para estes, imponentes com tanto óleo de peroba nas papadas, o melhor cirurgião é Gepetto.
Márcio Bambirra Santos
mb@mbambirra.com.br
Professor